Thursday, June 16, 2016

DIÁRIO DE VIAGEM - 19a tarde


Fui dar uma olhada nas ondas aqui na frente de casa e encontrei com o Dave from Flórida, surfista das antigas lá para os seus 50 anos que me lembra uma versão albina do Crocodilo Dundee, corpo de touro, cabelo branco até o ombro, olho azul quase de vidro, rosto enrugado do sol, pele cheia de sarda queimada e uma cara de gente boa até dizer chega. Em cidade pequena nenhum rosto é estranho.
Daí que passa um amigo de Dave a la Tarzan, barba e cabelo grande, peito de rei da selva e começamos a conversar sobre as ondas, Tarzan estava voltando do mar depois de uma hora e meia remando e as ondas fechando, não pegou nenhuma, estava cansado. Falavam que ia estar maior lá em cabuya, Dave falou que já ia com os amigos de quadriciclo, quando Tarzan respondeu que não tinha huevos pra enfrentar ondas tão grandes. Fiquei pensando nisso, eles também sentem medo. Aqueles homens enormes, preparados para gigantes e trovões, leões marítimos, sentem medo. Tarzan se foi e eu falei pro Dave da solidão de entrar sozinha no mar, respondeu dizendo como era bom olhar pra um amigo e dizer "we gonna die" para logo depois sair do perrengue rindo. Ele também pensa "we gonna die"...

Fiquei pensando nessa muralha viva, cheia de correntes e ondas surpresas, series longas, caldos mais longos ainda e esse desejo comovente de enfrentá-lo, de aprender incessantemente essa harmonia inconstante entre o medo e a conquista. 
Dave foi para Cabuya e eu fiquei mais segura por não ter medo sozinha, de saber que todos nós ali juntos e separados passamos por momentos de alerta e entrega o tempo inteiro, que o mar vai ensinando pequenas e grandes lições a cada braçada, cada mergulho, cada onda descida. Agora confortável com meu medo, me sinto mais preparada pra me jogar. (Calma, mãe, lembrando, perspectiva de semi-anã)