Thursday, June 28, 2018

Medo do Mar

Voltei pro mar. Mal o olho abria e já corria para previsão no telefone. Fazia quatro meses que não me jogava e já da esquina de prédios ouvi o tremor da areia- fim de ressaca, paredes grandes de ondas gordas. Do calçadão, balancei meu eixo. Avistei os amigos lá no fundo do Pontão e quis muito cair, mas a situação estava bem na linha vermelha do medo dentro do meu contexto. Pensei duas vezes, três, e fui passo anti-passo pelas próximas etapas: prendi a bicicleta me convencendo a ir até a areia, me despi ressabiada retardando o ato, guardei os pertences na turma do funcional já sentindo que ia voltar para pegar antes do previsto, e segui relutante rumo ao desejo. Já na beira, dois surfistas se encorajavam com pulinhos, bora, bora. Lá dentro dois de prancha e quatro de peito. O mar quebrava forte, séries grandes e lá pro fundo. “No way, Jose”, mas os amigos me viram lá de dentro e o chamado animado deles me quebrou. Já tem quatro meses. Molha os pés. A água estava clara e fresca e os dois surfistas tinham entrado rápido no entre série. Entra, mulher, não precisa pegar onda, só de estar nesse mar já vale o tanto. Me aqueci com meus cinquenta polichinelos ainda sem certeza, coração bombando no peito vai não vai. Ando precisando me sentir forte. A série terminou e os meninos começaram de novo a indicar com os braços que era o momento certo de eu entrar. Vai. Eu aguento esse mar. Suspirei fundo, busquei meu fôlego mais profundo e fui, mar adentro. Entrei na hora certa, sem maiores traumas. Celebramos as ondas, o dia, rimos e tal, mas logo a calma do silêncio marinho se instaurou e lembrei de assistir duas gaivotas voando baixo rente à superfície. O vento terral soprava a crista de cada onda no contraluz formando trezentos e sessenta graus de arco-íris no olho nu. Parede depois de parede pesada de água verde escura atravessava meu corpo como montanhas em movimento. E vinha a revolta da série e a seguinte calmaria da espera, as mil e uma correntes frias e quentes que tantas vezes tocavam simultaneamente diferentes pedaços do meu corpo aquático, o céu mais azul que o azul, o sol com o filtro suave do inverno ameno, e fiquei ali, lembrando da simplicidade do que faz feliz.

Re-Sentir

Não alimento mágoa, não guardo rancor, acho orgulho desperdício de tempo, vaidade. Assumo erro, peço perdão, acredito em desculpar. Busco mudar, seguir adiante compondo, agregando no que dá. Tenho meus tantos defeitos e procuro destrinchar um a um, achar o cerne, desatar nó e passar pro próximo. Não estou pronta, não estou certa, não sou definitiva. Busco caminhos, não verdades. Gosto de gente, de conhecer a fundo mesmo que só por uma conversa, gosto de perguntar detalhe, de ouvir histórias e volta e meia tenho umas para contar. Gosto de abrir cabeça ao meio e me deparar com o pote de ouro que mora dentro. Sou curiosa, exposta, um pouco invasiva e honesta em demasiado, busco com constância suavizar esses entre tantos outros pontos. Sinto que o tempo tá do meu lado, a busca também. Já quis o mundo agora quero chão, solo fértil, terra que brota. Enraizo meus pés, me rego, cresço tronco. Espero abrir galhos em folhas verdes e flores multicoloridas como a árvore de cinco cores daquela ruazinha do Leblon. Sou simples, quero o simples. Não piro em status, em fama, nem nada que ostenta. Gosto de abraço, beijo longo, mão dada e noite bem dormida. Gosto de mar, de céu azul, comida boa, risada rasgada e música para dançar. Sou ainda essa criança, sinto todo dia o seu pulsar. E bola para frente, o resto a gente segue construindo. 

Sunday, June 24, 2018

Estranhos

O sol saiu, bateu em nas folhas secas de árvores antigas e eu continuo vazia. O sol amarelou a manhã inteira mas meu peito é cinza. E não tem mar, areia, barco ou céu azul que aliviem esse aperto. Estamos separados desde que nos unimos, nos encontramos na beira e não houve mergulho, a cabeça nem molhou em poça rasa. E eu to aqui, na sua cama farta e lençóis brancos, eu me banho no seu mundo e vou perdendo o meu, vou perdendo o eu que você não vê. Não tem banho de sol que limite o amargo que sobra na boca depois de tanto beijo frio, interrompido antes do começo. Não estamos bem. Nunca estivemos de verdade na verdade. E não tem amor que seja o bastante quando o peito não enche.