Saturday, September 09, 2006

Monogamia

Venho chegando a conclusão que não sou de longo termo. Essa estória de “para sempre” para mim é mesmo uma baita versão romântica do “que seja infinito enquanto dure”. Com o tempo fica mais difícil entender casamento, papel assinado, contrato de amor eterno...Não consigo fazer sentido disso tudo. Como eu vou saber o quer eu vou sentir em vinte, trinta, três anos? Como é que se promete amor, e por que? Por que não pode ser escolha em aberto, escolha com direito a livre arbítrio? Não entendo essa estória, vou te dizer. Por que não posso ter direito de mudar de idéia ao longo do caminho, sem culpa como pano de fundo. Relação é honestidade e parceria, e tem que haver lugar para liberdade de se manter um indivíduo sem contratos assinados de vida conjugal. Acho que podemos nos amar para sempre e eu não preciso assinar pedaço de papel nenhum para legitimar isso.

As vezes acho que não sou capaz, nem preciso ser, de ter uma relação só para o resto da vida. Até hoje, não fui capaz ainda de continuar com tesão depois da descorta das diferenças irreconciliaveis. A verdade é que paixão é admiração, é afinidade, quando perco isso, perco tudo. Não encontrei alguém do meu tamanho.

Vivo me perguntando quem foi que inventou essa estoria de "cara-metade". Quem inventou que existe uma e só uma metade da laranja que encaixa com a sua? Ô besteira meu deus, haja laranja nesse mundo, e eu quero continuar provando. Quem inventou que ser humano tá no mundo para encontrar alguém e viver junto para o resto da vida por contrato? Eu nasci foi sozinha. Parceria é escolha diária, não decisão permanente sem direito de mudar de idéia...tá doido?
Digo isso do meu trono de divorciada, ainda com memórias frígidas do contrato sendo assinado e mais ainda do baita arrepio que tremeu minha espinha por dentro da pele e que sem dúvida se espatifou no meu olhar chocado de recém-casada. Demorou para cair a ficha que aquilo era mesmo um contrato de para sempre...quer dizer, infinito enquanto dur...cê sabe.

O fato permanente é que não quero nunca me acomodar numa relação sem tesão. Não quero deixar de ficar molhada e ter transas selvagens na minha vida, e ainda não encontrei a minha forma de manter isso em uma relação. Não quero deixar de ser louca e tarada, e criar fantasias meladas.

Sei lá, não quero ter um parceiro sexual só para o resto da vida. Não quero deixar de experimentar, e desvendar corpos diferentes em diferentes momentos da minha vida.Me imagino sim, e sempre fui desse jeito, tendo longas relações monogâmicas em diferentes fases, e pequenos períodos de experimentação entre as tais. Gosto de variedade, de diferença, de troca de jeitos, de desconhecer o outro, gosto de descobrir e inventar brincadeiras novas; gosto de diferentes toques, texturas, gostos, espessuras, tamanhos.

Não quero deixar de poder ter opção, não quero não poder querer.

HUmanos

E se toda dor acabar por doer igual, e se toda lágrima tiver o mesmo gosto, e por mais diversas que sejam as razões, todo sofrimento em sua raiz for irmamente semelhante?

E se ao menos no desespero formos todos iguais, e a dor é os que nos une?

E se for assim, pensando bem, qualquer sentimento é simplesmente o mesmo, independente de quem sente, seja dor seja felicidade. Eu te amo e outras estórias.

Todo ser humano é então igual em sua raiz.

Ontem sentindo um desespero ensurdecedor, e uma dor que parecia não ter saída, dúvida imensa de que algo jamais poderia se consolidar, sentindo esse medo que beira a desistência, e deixando todas as certezas derreterem em borbulhas rasas; ontem achando que não haviam mais opções, e mesmo lutando contra esses dois buracos em meu rosto que insistiam em virar rio; ontem, quando me deixei convencer que a minha auto misericórdia era então mais forte do que tudo que sempre soube (e sei) sobre mim, e que sentir pena de mim mesmo era por hora a única opção, ontem me entendi mais humana.

E pela primeira vez não houve mais a arrogância de me achar especial, melhor, pior, diferente. Ontem esqueci tudo que acreditava saber e descobri que somos iguais. Iguais não no âmbito das vontades e personalidades, e sim iguais no âmago das sensações, no desespero do sentir.

E pela primeira vez olhei para um mendigo no olho e perguntei o que ele sentia, óbvio que ele balbuciou que eu era louca e se eu não tinha um trocado não, não entendeu coitado que ali eu o tinha como irmão de espécie, pronta para ouvir e me identificar a fundo com suas dores e delícias.

Ontem desisti, segui em frente e fingi que nunca descobri que não tem qualidade que nos difere no sentir, fingi que não sei que somos todos humanos.