Friday, August 26, 2016

Medo

Não se engane, estou morrendo de medo. Mas uma vez, contra tudo e contra todos, me jogo no mundo. Sigo adelante regando coragem em busca de algo que mora em mim e que ainda não sei como acessar sem movimento externo. Sigo com medo mesmo por caminhos indefinidos sem plano a longo prazo. Estou aberta ao presente e para onde isso puder me levar. Não quero objetivo, quero jornada. Me jogo ao léu disposta à tudo, mudar país, mudar língua, mudar cultura, mudar o que for se mostrando necessário, mergulho e mudo junto, é para isso que eu vim. E sei que não é fácil de assistir, dá vontade de julgar, de oprimir ou até descreditar. A minha coragem põe em dúvida muita covardia alheia. Eu me movo mesmo assim, me movo forte pela certeza desse chamado em grito que ouço no peito, é hora de ir de novo, de mergulhar sem fronteiras e descobrir aos poucos para onde leva o caminho. É hora do extraordinário, de não ter controle, de não medir destino, de dar um passo de cada vez, sem pressa de  chegar. É chegada a hora, e eu vou com medo mesmo.
(voa com cuidado, ama com coragem, te libertas para o mar infinito)

Thursday, August 18, 2016

Insatisfeita, Incompleta e Faminta

Vivo uma relação de amor saudável com um homem dedicado e companheiro, moro em um apartamento bonito em um lugar legal e tenho uma carreira sólida construída com muita determinação e amor, me encontro à beira dos quarenta tendo conquistado todos os elementos convencionais para um adulto vivendo na nossa sociedade contemporânea, ainda assim me sinto insatisfeita, incompleta, faminta. Sinto uma angústia enorme dentro do meu peito, como se eu não coubesse nessa realidade, olho para minhas roupas no armário, os gastos específicos no extrato bancário, o ser cool da zona sul, e acho tudo uma bobagem dentro desse meu momento. Troco as cifras por moedas estrangeiras. Não consigo me imaginar aceitando o stress e os temas que me cercam, sento na mesa dos mesmos restaurantes e acho tudo um pouco exagerado, fora de contexto, não acho tanta graça nas festas e noitadas badaladas, acho meio chato ser pop, cool ou in. Acho também a cidade linda, a temperatura amena, as cores do dia mudando deslumbrantes, gosto da minha casa, de comer bem, de conforto, dos meus amigos, do meu trabalho e do meu amor, mas não é o bastante. Ouço o chamado. Quero ter filhos, quero formar família, quero exercer e amar muito meu trabalho, e sinto que para chegar à esse lugar preciso atravessar um deserto de tudo isso. Descobri nos dois meses fora um lado meu mais calmo, mais paciente, suave, generoso, doce, e um bando de coisa legal que me fez mais legal para mim e para os outros. Encontrei uma frequência de pensamento, de resposta, de troca que me permitiu paz na escuta ao outro e a mim mesma. Destrinchei cerne de conceitos muito importantes para mim que não consigo ainda, por inabilidade minha, manter de acordo com tudo que sinto aqui em meio ao urbano. Sinto fome de mundo sem certeza, sem meta e mais caminho, sem ego, sem fama, sem olho por olho e dente por dente, sinto vontade de viver por alguns meses sem objetivo distante, só no presente. Não procuro encontrar o nirvana, também não é assim, mas quero ter agora uma jornada individual por lados meus que nem eu conheço, viagem sem data de volta nem plano à longo prazo, viagem para mergulhar no que o universo me oferecer e ver sem expectativa aonde isso vai dar. Tenho medo sim, bastante até, posso até querer voltar quando chegar, mas me sinto preparada com todas as ferramentas para encarar o que não sei com destreza. Estou pronta. E peço perdão pela quebra de quórum, perdão à tudo e todos que esperavam de mim outra coisa. Sinto mais do que nunca que serei sempre um humano muito feliz, cheia de entusiasmo para vida, mas também extremamente descontente, sempre atormentada com minhas questões filosóficas sobre quem sou e o que eu vim fazer aqui, como quero viver essa meu curto tempo na terra, quantos mundos cabem em mim? Vivo em ciclos, mudo de cidades, países e mundos internos, conquistando metas a longo prazo com compromisso e amor em cada lugar que escolho, mas sinto claramente o início, meio e fim desses ciclos eventualmente e a necessidade de começar outros. Será que inteligência emocional é saber fechar os ciclos com gentileza quando eles se findam e não estendê-los até uma quebra traumática. To tentando chegar lá. Tenho fome de experiências diversas, de culturas outras, de pessoas que pensem, falem, sintam diferente de mim. Quero agora mais do que nunca ter liberdade de viver sem controle do futuro, em outras cultura, outra língua, outro céu e mar, para que antes de me entregar ao ciclo dos filhos eu possa mergulhar de peito aberto e cabeça livre nesse ciclone que gira em meu peito.

Wednesday, August 17, 2016

Tenistas e Coronéis

Sair do Leblon me privou das conversas acidentais com meu grupo de coroas favoritos, digo conversa deles porque eu fico só de ouvinte na mesa ao lado, disfarçando num jornal sem graça meu interesse pelo papo alheio. Um ano e meio passou e mais ainda para eles. O Décio continua popular e controverso, vestido de tenista mas agora sem a raquete, a voz evidentemente mais rouca, falhando, mas ainda performático, despejando sua gama extensa de palavrões enquanto conta suas aventuras joviais. O Coronel permanece quieto, se mantém recostando na cadeira, barriga e Rayban, fazendo raras incisões de sarcasmo e poderio. O Ronaldo apareceu empurrado por enfermeiro em uma cadeira de rodas, e sem a companhia de sua cadela pug, Juliana Paes, morreu de velhice eu ouvi, mas pelo menos ele parece ter passado a ser mais festejado do que zoado, deve ser medo de destino similar. Dr. Paulo trouxe a esposa Beth, eu nunca tinha visto uma mulher sentada na mesa deles, ela foi embora entre risos e enxotadas logo que cheguei na mesa ao lado e não deu cinco minutos o Dr. Paulo começou a falar do nível de "vagabundice" das passantes mais voluptuosas. Hoje eles não beberam café, só água tônica ou gasosa Perrier, mas falaram das tantas mesmas coisas, brigas do condomínio, gostosas do clube, problemas dos filhos, se zoaram sobre velhice e morte e gargalharam das piadas do Décio. Hoje sentei ao lado deles e pensei que o tempo passa sem parar de ser ingrato, será que eles também veem que eu mudei?