Tuesday, January 17, 2006

Ed Mort



Na onda do espírito edilsiniano politicamente incorreto e do alto de uma sórdida gargalhada diante da desgraça alheia, venho por meio desta reacender as chamas do inferno que hão de me queimar se um dia, por alguma desventura do caminho, eu perder minha imortalidade.

Hoje, depois de ter dado a tal da gargalhada rasgada na colega de escritório que deu um mole fudido e tava lá toda sem graça com a própria ignorância, e de ter outro co-worker braguejando que eu precisaria de vários Hard Drives para ter espaço o suficiente para escrever um pequeno resumo auto-biográfico sobre sarcasmo, tive então que relembrar minhas raízes e tudo que meu estimado pai Ed Mort, o qual recentemente mudou seu nome para Ed Vida numa tentativa de convencer os demais de sua alma limpa e seu tão bom coração... enfim, de tudo que o Ed Vida me ensinou e me "des-ensinou," quando com ele fui morar em torno dos meus 19 anos...

Sendo criada por uma mãe ética e generosa, com valores tão nobres, a qual sempre escolheu fazer a coisa certa mesmo quando "dar um jeitinho" teria resolvido, a mudança para casa do Ed trouxe sem dúvida novos conceitos e perspectivas à minha cabecinha já nem um pouco adolescente.

Verdade seja dita, sempre fui mazinha e sarcástica, e posso dizer que a raiz da minha maldade foi a maldade dirigida a mim durante minha primeira infância, em função de uma boca que de infantil nao tinha nada, e que até meus 12 anos me assombrou.

Aprendi em torno dos 7 anos que se eu usasse minha crescente criatividade e zoasse os outros (ou mordesse, caso o "outro" fosse do sexo oposto) antes de ser zoada, eu conseguia tirar minha boca do foco de mal atenção. Com o tempo, criei técnicas avançadas de zoação e peguei vários para Cristo. Criei traumas "seríssimos" em uma das minhas melhores amiguinhas (que cá para nos bem que merecia, sempre puxando o saco do grupinho das cocotas e sendo Maria-vai-com-as-outras), e marquei a infância de diversas crianças, que hoje adultos ao esbarrarem comigo insistem em me mostrar, às gargalhadas (?), a marca de uma das minhas mordidas, ou contar todo o sofrimento que o apelido por mim dado gerou.

O fato é que nunca tive vergonha de trazer à tona meu lado diabólico, e acho que se for parar para pensar, antes ser diabólica engraçadinha em público, fazendo minhas maldadezinhas brancas, do que me fazer de Poliana e por dentro ser pútrida como a maioria dos queridinhos desse mundo. É importante ressaltar que não desejo e não faço mal à ninguém, porém não hesito em gargalhar se um desavisado atropeçar numa casca de banana, e vou ser a primeira a dizer na lata que alguém engordou. Ah, é importante enfatizar também que me incluo nas minhas críticas, tenho uma vocação maravilhosa para rir da minha própria desgraça.

Mas voltando a vaca fria, hoje do alto da minha gargalhada, lembrei de alguns ditos que meu pai sabiamente me ensinou e eu passarei orgulhosamente de geração para geração em minha família:

Primeiro sobre mim:
"Essa Chiquinha não é flor que se cheire"
"Quem não te conhece que te compre, minha filha querida"
"Deus não dá asa a cobra"
"Criei meus filhos para o mundo, sai da minha asa jacaré"
"Chiquinha, minha diaba loura"
"Que Alá te proteja" (quando desliga o telefone, e não, Ed pode ser tudo menos religioso)

Sobre ele mesmo:
"Eu era tão feio, mas tão feio, que meu apelido era "Praga de Mãe", e se algum dos meus coleguinhas fizesse algo errado, as mães jah gritavam alto: "se ficar de mal-criação vai ficar feio igual ao Edilsinho"
"Toda toalha de seda tem sua franja de algodão"
"Tô certo ou estou certo?"
"Vou comer até o cu fazer bico"
"Chiquinha, morde meu ombro que eu preciso recobrar minha energia"
"Com calma e serenidade assistiremos à transformação da folha de amoreira em seda"
"Intimidade só gera filhos e aborrecimentos"
"Amar, pagar paixão, e essa estória de relacionamento é tudo bobagem, coisa para otário"
"Queres problemas; tem filhos. Queres inimigos: empresta dinheiro"
"Não cutuca cobra com vara curta" (quando eu invento de encher o saco dele)

Sobre os outros:
"Tem coisa melhor do que falar mal de amigo"
"Quem, o Paulinho, aquele piroquinha de jabuti?"
"Nada melhor do que rir da desgraça alheia"
"Detesto fazer favor"
"O que você nao me pede rindo que eu nao faço chorando"
"Sou crioulo então posso falar mal de crioulo"
"Medicos, advogados, Tijucanos e fumantes, oh povinho brega e careta"
"Todo gordo é legal, tem que ser né..."
"Nao basta ser gente boa, de gente boa o inferno tá cheio"

•Quando em uma fila de super-mercado, Ed Bonitao não hesita em dar um arroto matador e acusar o filho que estiver mais próximo;
•Ed é sempre o primeiro a soltar pum no elevador;
•Ed manda na lata de qualquer amiga minha que ele acabou de conhecer, que ela precisa da dieta do arroz integral urgente, uma vez que quando ele apertou inocentemente a bunda dela (?) o resultado não foi tão firme quanto ele esperava.
•Ed aliás, adora apavorar amiguinhos meus, se faz de caretérrimo quando esbarra comigo fumando um baseadinho no quarto com os amigos da faculdade e deixa geral sem saber o que fazer.
•Ed atende ligação de namorado meu e diz que um "rapaz," ou o "Paulo Antônio" (???), já passou para me buscar, isso quando ele nao volta e imita minha voz, todo sedutor
•Ed inclusive não hesita em pegar a extensão e dar uma zoadinha, no caso eu esteja meio alterada numa ligação com namorado
•Ed adora falar mal de mim para o meu irmão e do meu irmão para mim.
•Ed tem sempre mais de uma namorada, e qualquer artefato nao identificado encontrado por uma delas em casa (de brincos a calcinhas) são e serão sempre da Chica, por mais que eu já nao more lá há anos.
•Ed vende a imagem de anti-carne vermelha/pizza/refrigerante, mas nao posso entrar à fundo nesse específico assunto ou corro sério risco de perder anos de contato com meu prezado pai
•Ed me chama de Roberto Carlos por causa das minhas pernas.
•Ed acorda insuportavelmente bem humorado por volta das cinco da manhã e fará de tudo para acordar quem estiver por perto
•Ed nunca dividiu, e ressaltando, jamais dividirá comida igualmente, nem com os filhos nem com ninguém.
•Ed esconde os queijos e castanhas quando eu estou em casa.
•Ed diz que seu maior sonho sempre foi ter piolho, uma vez que seu maior prazer é receber qualquer forma de contato físico
•Ed diz também que sonha em implantar pentelho na careca (oops, careca não que ele está longe disso) por que nunca ouviu falar em uma pessoa careca na zona púbica.
•Ed reconhece o cantar de uma variedade de pássaros e sem dúvida escolhe frutas como ninguém.
•Ed nos botava para dormir contando lendas indígenas. Tendo índio Bruno e índia Chica sempre como personagens principais, e índio Edilson salvando a mocinha com bum-bums fétidos o bastante para matar qualquer jacaré.

Ed sem dúvida é uma figura única, personagem singular dessa mistura de Amazônia com Rio de janeiro, o qual eu não poderia ter mais orgulho de ser meu pai. Ed é o culpado maior pela minha crueldade branca e a filhotinha de cobra que sou, mas é também responsável por grande parte da minha garra e minha atitude pé-no-chão. Ed acima de qualquer coisa me ensinou sensatez e faz de tudo para me ensinar serenidade. Ed junto à Dona Beth, me passou esse senso crítico e a gana por cultura, leitura e aprendizagem em geral. Ed infestou minha vida de bom humor e me mostrou que nao há nada melhor do que uma cantoria alta pela manhã ("Chiquinha, eu fiz tuuuuuuudo para você gostar de mim...). Ed me ensinou afeto, abraço, massagem no pé e sempre exigiu todo o cafuné que tem direito. Ed lidou com minhas loucuras, sempre me dando toques e esporros pertinentes, porém mais do que tudo, me deu e dá todo suporte nas minhas decisões e também nos perrengues que de quando em vez a vida me proporciona.

Ed é meu pai amado, Edilson Rodrigues Martins, e haja papel para expressar a saudade que sinto de você.