Thursday, September 13, 2018

É Sempre Bom Lembrar...

Quatro gaivotas planaram rente à espuma do mar mexido, ele olhou para o vasto e sentiu a imensidão. Andava engasgado, juntando os cacos, transbordando aos poucos bocejo travado que não deixava o nó no peito desapertar - mas tá melhorando, dizia ele, falta cada vez menos para dissipar. Talvez em pouco tempo bastasse um soluço para destravar de vez, sacudir a poeira e pegar no tranco. Talvez não. Sonhava com cautela passo largo de perna que acostumara a ser preguiçosa. Mas era mais, era forte, elástico, força bruta em corpo compacto e flexível, explosão e tormento, ternura e suavidade. E a mente inquieta pairava em mil poesias dos tantos detalhes de flores, folhas, rachaduras em rochas e todo o azul que o mar resplandece. Tinha dor de homem menino e encantamento de menino homem. Era de sal, de terra, sólido, raiz de tronco largo de seiva doce, pérola em concha, ouro raro em rio escuro, era um bando de coisa linda mas se disfarçava de areia fina e achava que passava transparência. Vinha cavando esse buraco em movediça fazia tempo, mas volta e meia vinha a maré cheia, enchia o copo de mar e o vazio ficava pleno pelo breve vagar daquele instante, e ele afinal entendia que era completo. Nesses dias via no espelho embaçado do banheiro o brilho lá no fundo do olho e lembrava de tudo, de quem era, do que queria, da força que tinha. Era grande.