Saturday, October 20, 2012

No Osso

Patela, acrômio, dedão do pé, bando de osso quebrado. Ele era assim, dividido em parcelas; retalho de cicatrizes veladas e vontades inversas. Dizia que não gostava das próprias marcas, não andava se gostando – estava tão quebrado quanto o talo de seus certos ossos. Era é viciado em sabotagem. Afligido por uma imensa teimosia, insistia em confundir integridade com essência, e assim achava que suas margens eram limites – nada fora daquilo cabia. Resistia ao que  ainda não havia descoberto de si, achava que já sabia. Mas não, ainda não havia palpado o entendimento do que podia vir a ser se deixasse ser. Pensava demais, mais do que devia. Tinha receio de se perder no escuro de seu próprio desejo; mais fácil mudar de rota do que seguir em frente, mais fácil escapar, não mais voltar, só para tropeçar na mesma pedra mais a frente, e repetir tudo de novo, num ciclo que não se recicla, tão insustentável quanto o preço do bambu como matéria prima de sonho. É mais fácil fugir do que ficar. E no tal balde que tanto considerava chutar, balde de água mais para quente do que fria, sonho nadava em nuvem, onda à beira de se esparramar pela cozinha do apartamento provisório – não tinha mais onde morar. Insistia em se trancar no silêncio de sua dor, sua solidão, persistia em esconder segredo do próprio peito, sem saber que tudo transbordava no olhar. Era só olhar, estava tudo ali, tão claro, tão transparente em cada palavra, que era mesmo surpresa que a contradição em seu discurso não ecoasse em seus cantos. Andava desencantado, boneco quebrado, sem corda para dar.