Saindo de uma preparação de elenco agora, pedi um isqueiro para um grupo
de três pessoas na porta de um estúdio, um deles me perguntou se eu era
atriz e eu falei que era assistente de direção, ele deu um grito e
falou muito feliz "não acredito que um assistente de direção está
falando comigo", eu surpresa respondi "como assim, qual a diferença
entre a gente?" Ele disse "ué, você é uma assistente de direção e eu um
figurante e você está me olhando no olho e sendo gentil", eu respondi
que não via as coisas assim, éramos ali dois humanos em uma situação
corriqueira, que meu nome era Chica e perguntando o dele, fiz a devida
apresentação de beijinho e abraço e deixei ele abrindo meu maior sorriso
enquanto ele ainda comentava animado com os amigos a excitação da nossa
interação. Saí dali pensando muito no abismo humano que o poderio gera
sob as relações profissionais. Saí pensando em uma cultura de status e
cargos hierárquicos que eu não consigo jamais compreender por esse
ângulo, se não somente pela logística de uma operação organizacional que
precisa de líderes e não tiranos.
Eu particularmente amo muito a
figuração, tenho zelo e apego pela dedicação e amor que eles trazem todo
dia ao set, ainda mais se respeitados e olhados com atenção, sei o quão
são capazes de se entregar e se concentrar, e isso se estende à toda
equipe.
Espero ansiosa por um dia que isso não acontecerá mais
nesse meio, que não só os assistentes mas todo e qualquer cargo tiver a
humildade de entender que todos choramos, amamos, cagamos, e nada nos
separa nem de outros humanos, nem dos animais, nem da natureza. Um mundo
em que de fato entendemos que somos todos um só, e que a gentileza e
humildade permeiem todas as relações, especialmente as hierárquicas.
Mesmo porque nada como uma troca sincera de carinho, mesmo que furtivo,
para criar em meio a nossa batalha diária um momento de amor.