Dizia que não sabia conversar, não tinha o
hábito, falava mesmo era com música. Tocar também não era seu forte, tocar em
gente dizia, namorava instrumentos. Mão dada dera uma vez numa tarde ensolarada
de um passado que fechara o olho para lembrar, havia tempo, havia tudo tão
ficado para traz e ele se fechara pro que morava do peito para fora, guardava ali
dentro desalento com gosto de lágrima salgada e doce também, que pouco sabia
mas muito era doce, de dar água na boca tinha dia. Na palma grande com seus dedos pequenos morava ternura crua, bela adormecida em meio a campo minado,
coroa de espinhos que carregava o peso dos comprometimentos que achava que
tinha, do lugar que assumira, do papel que escolhera. Não tinha que nada mas
controlava tudo, queria ser o dono do próprio destino, maestro de sua
partitura, não deixava o vento levar, mania de nadar contra
corrente. Andava mesmo era preocupado, havia tudo um pouco
desandado, pé descalço sobre caco de vidro em grama molhada, bolso furado.
Vivia a urgência da potencial iminência de algo grave, lhe faltava tanto ali à
margem de seus trinta anos e tanto tinha nas mãos, na cabeça de homem-gigante
que era, do alto de seu tamanho enorme, do peso de seu corpo entregue numa cama
bege de uma cidade quente com uma lora livre lhe dando a mão. Ele dominava a
rédea, ela confiava no caminho, ele controlava o passo, ela entregava ao léo o
desejo ardente do seja o que for, ele cedia, ela oferecia. E via
nele mais do que a dor, mais do que a angustia, mas do que nuvem cinza, via era
céu azul, via sol para lá de amarelo, via pingo de chuva em rio de água doce,
sabia bem das pedras no caminho. Não tinha pressa, era só o começo.