Carrego a gratidão de alguém que sabe que sempre pode ser pior.
Carrego gosto de separações, mortes, terremotos, tragédias de quem vive como se
tivesse atravessado a pior das hipóteses – não foi a pior, das piores a melhor,
das melhores a tal da solidão, solidão que devasta, que desconstrói para
recriar. Da solidão ficou o gosto do que vem depois, como se ela fosse
o fundo do poço de um poço que você sabe que vai sair, por mais que você
acredite não poder crer, você sabe lá no fundo de todos os fundos, de todos os
poços, você sabe que estar ali é necessário para o que vem depois, e quando
assim termina, quando você sai, você sabe que
sempre há saída, todas as vezes. Guardo em mim gosto de herói, herói de
si próprio, herói que se salva, gosto de quem acredita em si apesar de tudo,
apesar de cada insegurança que vive no peito de cada um, eu que guardo tantas,
mas uma que não guardo é a de que não vou atravessar – posso atravessar tudo,
vou atravessar tudo. Guardo essa noção das escolhas que a gente tem, das saídas que a gente pode encontrar – sempre há
saída, não há pessimismo que negue isso, por mais que seja a menos
terrível das saídas, há saída, então é por isso que eu vivo sorrindo, vivo com
essa alegria enorme só de acordar, essa vontade de nunca querer dormir, de não
deixar o dia acabar, é por estar aqui e a cada dia continuar fazendo da merda
adubo, do limão limonada, de tantos clichês que podem explicar essa tal
sensação de conquista, da simplicidade de ser feliz por ser, por estar, por
persistir apesar de cada e todos os obstáculos, não tem tombo do qual eu não
consiga levantar. Não tenho medo.